Está disponível na Globoplay (ou no Globoplay? Nunca soube bem ao certo e sigo sem saber) o filme “Storm Video”, do diretor Samuel Valladares. A obra, de 53 minutos − o que a faz transitar na pouco difundida esfera do média-metragem –, é um acerto digno de nota.
Com absoluta simplicidade e total ausência de qualquer coisa que possa se assemelhar a um roteiro – é uma câmera com qualidade duvidosa na mão do cineasta, na maioria das vezes parada na mesma posição – o filme consegue, como poucas vezes se viu, captar a essência de uma época e de um lugar. E a essência é o desmantelo.
O filme mostra o dia a dia da, provavelmente, derradeira videolocadora do Rio de Janeiro, a Storm Video. Tendo como personagens o impagável e indescritível Zé Carlos, proprietário e, atualmente, único funcionário, e Silvio, ex-funcionário que continua indo lá todo dia mesmo após ter sido demitido, o enredo vai se construindo com absoluta naturalidade, entre um telefonema e uma admoestação entre os dois.
O mais incrível é que, mesmo diante da iminente ruína de tudo aquilo, de alguma formar a engrenagem segue funcionando. Quem, meu deus, quem, a uma altura dessas do campeonato, aluga filme em locadora? No decorrer da película a resposta vai se dando, mas, também, podemos estimar. Saiamos um pouco de nossa bolha. Quantas e quantas pessoas não tem acesso ao melhor do streaming? Seja por não quererem pagar mais do que R$ 50 em uma Netflix (há mais baratas), seja por falta de uma internet à altura da missão, seja pelo desencontro para com a tecnologia em si. O fato é que, sim, há quem realmente precise alugar filmes em uma locadora.
Outro tipo curioso é o acadêmico, que, em busca de algum título do tempo do onça, recorre ao largo acervo da Storm Vídeo. Eu me lembro muito bem dos tempos da faculdade e o que eu não daria por uma cópia de “Deus e o diabo na terra do sol” e não havia 2001 que resolvesse meu problema. Àquela altura teria me caído muito bem uma Storm Vídeo.
Uma curiosidade é a logística da coisa: acreditem ou não, Zé Carlos é quem faz todas as entregas e retiradas. Não fica claro se ele o faz a pé ou de bicicleta, mas, independente disso, é quase impossível imaginar como todo o processo pode ser sustentável. A tarefa é mesmo hercúlea!
Para entenderem um pouco mais o espírito da coisa, vejam o trailer abaixo, que mostra uma das cenas mais memoráveis do filme. Algum cliente liga e pede o filme “Coming Soon”. Zé Carlos tenta explicar que até hoje não foi produzido um filme minimamente decente com um título desses. É maravilhoso!
No fim, o que fica é a sensação de angústia, de vazio. Até quando aquilo tudo, cravado no coração de Copacabana, resistirá? Não sabemos e, talvez, a resposta dada pelo tempo nos surpreenda, tal como surpreende o fato de que, até hoje, haja quem alugue filmes por aí. Pelo sim, pelo não, vale muito assistir a ‘Storm Video” e fazer essa ligeira viagem ao insólito.